Por Karina Toledo
Agência FAPESP – A prática de atividade física em piscina
aquecida pode ser uma ferramenta valiosa no tratamento de pacientes com
hipertensão resistente, mostrou uma pesquisa realizada na Universidade
de São Paulo (USP).
O estudo randomizado foi feito com 32 voluntários cuja pressão
arterial permanecia alta apesar da terapia feita com três ou mais
classes de medicamentos. Após 12 semanas, o grupo submetido ao protocolo
de treinamento não apenas havia atingido patamares considerados ideais
de pressão arterial como também apresentou redução dos hormônios
responsáveis pela vasoconstrição e tensão dos vasos sanguíneos.
Especialistas apontam a hipertensão como fator de risco para diversas
doenças graves, como acidente vascular cerebral, infarto, insuficiência
cardíaca e doença renal. Estima-se que esse risco seja cerca de três
vezes maior em casos resistentes quando comparados a pacientes com
hipertensão controlada.
“A incidência do problema é grande na população hipertensa. Entre 20%
e 50% dos pacientes não atinge a pressão alvo mesmo com tratamento
medicamentoso”, disse Guilherme Veiga Guimarães, pesquisador da
Faculdade de Medicina da USP e coordenador do estudo
apoiado pela FAPESP.
De acordo com Guimarães, que coordena o Laboratório de Atividade
Física e Saúde do Instituto do Coração (LAtiS-Incor), a ideia de
investigar o efeito dos exercícios em piscina aquecida nos hipertensos
resistentes surgiu após um estudo anterior, feito com portadores de
insuficiência cardíaca, mostrar diversos benefícios.
“Verificamos diminuição da frequência cardíaca, aumento do volume de
sangue bombeado pelo coração por minuto, melhora da função cardíaca e
aumento do
shear stress (tensão no endotélio causada pelo fluxo
sanguíneo capaz de induzir uma maior produção de óxido nítrico, que é um
agente vasodilatador)”, disse.
“Também houve aumento do peptídeo natriurético atrial (hormônio
relacionado com a redução da pressão arterial secretado por células
musculares cardíacas atriais) e de vasodilatores como o monofosfato de
guanosina cíclica (GMPc), nitrito (NO2) e nitrato (NO3). Por outro lado,
houve inibição da vasopressina, hormônio antidiurético, o que resultou
na maior produção de urina pelos rins e contribuiu para a queda da
pressão sanguínea”, contou o pesquisador.
Quando os indivíduos são submersos, acrescentou Guimarães, apresentam
inibição da atividade simpática, responsável pelo aumento da frequência
cardíaca e vasoconstrição vascular. Também ocorre supressão do sistema
renina angiotensina aldosterona, relacionado com a vasoconstrição e a
reabsorção de sódio, que favorecem o aumento da pressão arterial.
“Partimos do pressuposto que, em pacientes com hipertensão
refratária, o treinamento em piscina aquecida poderia também promover
adaptações neuro-hormonais, cardiovasculares e renais benéficas para o
comportamento da pressão arterial e do sistema nervoso simpático”, disse
Guimarães.
Hormônios vasoconstritores
Os 32 voluntários de ambos os sexos foram selecionados em um universo
de 125 pacientes em tratamento no Hospital Universitário (HU) da USP.
Foram excluídos maiores de 65 anos, portadores de doenças associadas,
como diabetes ou insuficiência cardíaca, portadores de lesão em
órgãos-alvo, como coração, rins e olhos, portadores de doenças
ortopédicas ou dermatológicas que impedissem o uso da piscina, e aqueles
cuja hipertensão resistente era resultante de uma outra doença
principal, como insuficiência renal, por exemplo.
A média de idade dos selecionados foi de 55 anos – com variação de 5
anos para cima ou para baixo. Todos passaram por uma avaliação anterior
ao experimento, que incluiu um teste de esforço cardiopulmonar, coleta
de sangue para dosagem hormonal, aferição da pressão arterial no
consultório e também por um método conhecido como MAPA (Monitorização
Ambulatorial da Pressão Arterial), no qual medidas são feitas a cada 20
minutos, durante 24 horas, por um monitor acoplado à cintura, com o
objetivo de registrar as variações durante o ciclo de sono e vigília.
Metade da amostra foi então submetida a sessões de 60 minutos de
atividade física em uma piscina aquecida a 32ºC, três vezes por semana,
durante 12 semanas. Já o grupo controle foi aconselhado a manter suas
atividades de rotina.
“O protocolo era composto por exercícios calistênicos (que usam o
peso do próprio corpo como resistência) e caminhadas dentro da piscina. O
nível da imersão na água foi até o processo xifoide (altura da boca do
estômago), promovendo redução do tônus vascular e resistência
periférica”, contou Guimarães.
Cerca de 72 horas após o término da última sessão de exercícios, os
voluntários foram reavaliados. Enquanto o grupo controle apresentou
resultados praticamente inalterados, como esperado, no grupo treinamento
a pressão arterial ambulatorial caiu de 165/88 para 129/76 mmHg – valor
dentro da faixa considerada ideal.
Durante o teste de esforço, a pressão máxima caiu de 198/93 mmHg para
175/86 mmHg no grupo treinamento. Além disso, o tempo de tolerância ao
exercício aumentou de 9 para 13 minutos em média.
A análise sanguínea também revelou queda significativa dos hormônios
vasoconstritores no grupo treinamento. A dopamina, por exemplo, passou
de 140 micrograma por mililitro de sangue (µg/ml) para 40 mg/ml. A
noradrenalina caiu de 350 µg/ml microgramas para 150 µg/ml.
“Reavaliamos três dias após última sessão de treinamento para ter
certeza de que as mudanças não eram apenas resultado de uma
vasodilatação momentânea causada pela água quente. E vimos que os
benefícios perduravam”, explicou Guimarães.
Segundo o pesquisador, uma nova reavaliação foi feita três meses após
o fim do experimento. Embora os pacientes tenham apresentado valores um
pouco mais elevados de pressão arterial – de 119/71 mmHg passou para
129/75 mmHg –, ainda estavam dentro da faixa considerada ideal.
Uma parte do trabalho, feita como piloto e sem a inclusão do grupo controle,
foi publicada no periódico
Blood Pressure Monitoring. Os resultados completos devem ser divulgados em breve no
Journal of Cardiology.
“Agora estamos estudando pacientes com hipertensão resistente
verdadeira, pois no experimento anterior foram incluídos alguns
‘hipertensos de jaleco branco’, ou seja, pacientes que apresentam
pressão elevada no ambulatório, mas tinham resultado normal no MAPA.
Nesse novo estudo deixamos apenas os pacientes que apresentam pressão
arterial não controlada no ambulatório e no MAPA”, contou o pesquisador.